Nota de defesa da Justiça do Trabalho e dos direitos sociais

O SINAIT (Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho) vem a público manifestar apoio à Justiça do Trabalho e defender a prevalência de suas decisões como ramo do Poder Judiciário especializado no Direito do Trabalho.

A entidade também se coaduna ao entendimento de diversas instituições do mundo do trabalho, incumbidas de zelar pelo sistema público de proteção ao trabalho, de que julgamentos recentes do Supremo Tribunal Federal acabam por desconhecer a importância dos direitos sociais na consolidação da democracia, ao anular decisões da Justiça do Trabalho.

A partir da devida crítica às reformas trabalhistas precarizantes realizadas nos últimos anos no país, é preciso retomar a primazia do texto constitucional, que conferiu aos direitos sociais, entre eles os trabalhistas, caráter de garantia fundamental. Mas, infelizmente, diversas interpretações atuais da Suprema Corte, ao desconsiderar a competência da Justiça do Trabalho, contribuem para a redução dos direitos trabalhistas e favorecem a conduta de maus empregadores que reiteradamente fraudam contratos de trabalho para evitar incidência de direitos e responsabilização.

No âmbito socioeconômico, a falta de observância das garantias fundamentais dos trabalhadores conduz a trabalho precário e degradante, falta de renda e miséria, baixo desenvolvimento humano e econômico, acidentes, adoecimentos e mortes ligados a causas ocupacionais, trabalho infantil, crescentes desigualdades sociais e econômicas, falta de dinamismo e produtividade na economia. Sob o falso argumento de que direitos trabalhistas são gastos, segue a destruição do país como um todo, sob a forma de empresas e um sistema econômico ineficiente e injusto, deterioração do tecido social, sobrecarga dos sistemas públicos de previdência e de assistência, e mais uma longa lista de mazelas com as quais os Auditores-Fiscais do Trabalho e outros agentes públicos se deparam cotidianamente.

Não é possível que se adote uma perspectiva meramente econômica em detrimento dos direitos constitucionais. O Poder Judiciário, assim como todo o sistema público de proteção social, deve agir para garantir a efetivação dos princípios fundamentais da República, com ênfase na centralidade da dignidade humana e no equilíbrio entre os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

Num momento de defesa e reafirmação da democracia, em que o STF tem tido papel preponderante, o SINAIT e todos os que defendem justiça e equilíbrio social fazem um chamado para que seja repensada a trajetória que o país segue também na seara trabalhista e social. A pessoa e sua dignidade devem tutelar o ordenamento jurídico, conformando a busca por lucros a diretrizes civilizatórias basilares nas relações de trabalho.

O direito do trabalho deve ser visto como instrumento de afirmação democrática e de combate às desigualdades indesejáveis mas tão presentes no país. A fim de que essa visão se concretize, é preciso respeitar e valorizar as instituições do trabalho, como a Justiça do Trabalho, a própria Auditoria-Fiscal do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho e as organizações sindicais, que atuam para trazer equilíbrio à inerente desigualdade das relações laborais.

Essa visão civilizatória tem sido fundamental no enfrentamento de problemas como trabalho degradante, trabalho infantil, e para mostrar a aderência do país à agenda global de trabalho digno ou decente encampada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e inserida na Agenda 2030 das Nações Unidas (ONU).

Assim, o SINAIT reitera a defesa de que decisões sobre a aplicação da legislação trabalhista devem ser realizadas pelas instâncias trabalhistas, não pelo STF. Também reafirma o papel da Justiça do Trabalho na análise de fraudes trabalhistas e nulidades. É inadmissível a autodenominação de contratos para subtraí-los do escrutínio da Justiça do Trabalho, cabendo o registro de que outras formas contratuais somente são válidas se não houver pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade.

O Sindicato Nacional ainda destaca que, a fim de garantir o cumprimento do texto constitucional, em especial os direitos e garantias fundamentais, as instituições do mundo do trabalho precisam de valorização e fortalecimento. Além do respeito à coisa julgada trabalhista, é preciso que as diversas instituições e seus agentes tenham asseguradas condições adequadas para atuar na proteção do trabalhador.

 

 

 

NOTA DE REPÚDIO – Contra a tentativa do Prefeito de Salvador de politizar a Auditoria-Fiscal do Trabalho

Após anos de ataques e sucateamento, a carreira federal responsável pela Fiscalização do Trabalho no País segue sofrendo ataques, desta vez por parte do Prefeito de Salvador (BA).

Com a interdição e paralisação das atividades de montagem de uma estrutura projetada para ser uma passarela para trabalhadores ambulantes durante o carnaval de Salvador, o Prefeito Bruno Reis vai à imprensa com a seguinte declaração: “Eles solicitaram a interdição, e aí cada um tem o direito de ter a sua opinião. Espero que o futuro possa mostrar que tinha muita gente querendo aparecer, mas caiu do cavalo. Não tem medida a ser adotada, depois dos laudos e pareceres, a prefeitura vai continuar montando a estrutura” (CORREIO, 02.02.2024). https://www.correio24horas.com.br/minha-bahia/prefeito-afirma-que-passarela-para-ambulantes-na-barra-sera-mantida-0224

 

Ao dizer que um órgão como a Auditoria-Fiscal do Trabalho vai “cair do cavalo”, o Prefeito parece desconhecer as reais funções da Fiscalização e da Inspeção do Trabalho: instituição vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) que tem como funções básicas garantir o cumprimento das leis e promover condições de saúde e segurança nos ambientes de trabalho. Ao contrário do que pensa o gestor da capital baiana, a nossa atuação não se baseia em opinião individual mas, sim, em critérios técnicos bem regulamentados. Nós só “cairemos do cavalo” se, por acaso, não cumprirmos o nosso papel de preservar a segurança das trabalhadoras e trabalhadores.

 

Tentar politizar e fazer crer que a Fiscalização do Trabalho está se deixando influenciar por interesses pessoais em relação a um assunto tão sério quanto a garantia da integridade física de trabalhadores que exercem atividades em altura, é uma maneira do Prefeito desmoralizar uma instituição séria, competente e fundamental para o bom funcionamento da nossa sociedade.

 

Na verdade, o Prefeito de Salvador deveria demonstrar indignação acerca da situação flagrada pelos Auditores-Fiscais do Trabalho e cobrar que os seus órgãos municipais de fiscalização também atuem dentro da legalidade e exijam que a empresa contratada cumpra as normas regulamentadoras, em especial a NR-18 e a NR-35, que tratam das condições de trabalho na indústria da construção e dos requisitos e medidas de prevenção para o trabalho em altura, respectivamente.

 

A Auditoria-Fiscal do Trabalho, no Termo de Interdição lavrado, com base na legislação vigente, determina que:

1. Toda montagem, manutenção e desmontagem de estrutura metálica deve estar sob responsabilidade de profissional legalmente habilitado;

2. A atividade de montagem e desmontagem deve ser realizada com SPIQ (sistema de proteção individual contra quedas constituido de sistema de ancoragem, elemento de ligação e equipamento de proteção individual, em consonância com a NR-35), e por trabalhadores capacitados que recebam treinamento específico para o tipo de estrutura metálica utilizada.

A nossa função social de preservação da vida e de promoção do trabalho digno não pode ser colocada em dúvida. Mesmo agora, em que estamos em meio a uma mobilização nacional por melhoria das nossas condições de trabalho, não nos furtamos a exercer nosso papel de fiscalizar e garantir que o meio ambiente de trabalho seja seguro e saudável.

 

Considerando as centenas de milhares de pessoas mortas e feridas em acidentes de trabalho ao longo dos últimos anos, não podemos abrir mão de nosso dever.

 

Jamais deixaremos que os embates políticos, especialmente os que se prestam a polarizar a sociedade e enfraquecer as entidades fiscalizadoras, ponham sombra na ética e na responsabilidade que juramos honrar quando da posse em nossos cargos.

 

Nosso compromisso com o trabalho digno e a justiça social não é apenas um slogan. É a própria razão da nossa existência.

 

Salvador (BA), 3 de fevereiro de 2024.